David Mourão-Ferreira

Eram, na rua, passos de mulher.
Era o meu coração que os soletrava.
Era, na jarra, além do malmequer,
espectral o espinho de uma rosa brava…


Era, no copo, além do gim, o gelo;
além do gelo, a roda de limão.
Era a mão de ninguém no meu cabelo.
Era a noite mais quente deste verão.

Era no gira-discos, o Martírio
de São Sebastião, de Debussy.
Era, na jarra, de repente, um lírio!
Era a certeza de ficar sem ti.

Era o ladrar dos cães na vizinhança.
Era, na sombra, um choro de criança.

in, Infinito Pessoal

      Nuno Júdice sugeriu este poema como o melhor poema de amor da literatura portuguesa. 

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