Leonard Cohen's Come Healing cover



      This request for reparation is very suitable to Lent.  The song finds Cohen asking that the heavens hear this "penitential hymn". "I'm not sure what this means," said the singer-poet during a press preview in London (as reported by The Sun), "Is the penitence appropriate to God or man? I mean who is to blame for these catastrophes?"


Herbert James Draper - The Golden Rays



      Herbert James Draper was an English painter whose career began in the Victorian era and extended through the first two decades of the 20th century. Here, a child is mesmerized by the golden rays which probably come through a window above. She forgot everything with the innocence of her eyes. The basket can wait.

 

Carlos Edmundo de Ory - Propositions

 


Que os adolescentes nos tragam os seus poemas e não os escondam.

Misturar o quotidiano com a metáfora.

A verdadeira linguagem é incompreensível, diz Artaud.

Dantes, a magia era um ofício permanente do homem.

Lucidez do alucinado.

O contrário da poesia aberta é a propaganda.

Matai os autores, ressuscitai as pessoas.

O último poema será sempre o primeiro. A poesia é inesgotável.

Um acto moral da poesia, desconcertar o público, e da música, e da pintura.

Não existem palavras especificamente poéticas.

Um poema é.

Não buscar as palavras, escrever ao correr da pena.

Esvaziar-se. Estar vazio.


Que los adolescentes nos traigan sus poemas y no los oculten más.

Mezclar lo cotidiano con la metáfora.

Todo verdadero lenguaje es incomprensible, dice Artaud.

Antaño, la magia era un oficio permanente del hombre.

Lucidez del alucinado.

Lo contrario de la poesía abierta es la propaganda.

Matad a los autores, resucitad a las gentes.

El último poema será siempre el primero. La poesía es inagotable.

Desconcertar al público es un acto moral de la poesía, de la música, de la pintura.

No existen palabras específicamente poéticas.

Un poema es.

No buscar las palabras, escribir a vuela pluma.

Vaciarse. Estar vacío.


    Tradução de A.M. no Blogue Rua das Pretas


Carlos Edmundo de Ory - Inverno

 


Ouve-se apenas a chuva

como beija

Com suas bocas sedentas

os olhos da terra


Ouve-se apenas a chuva

como um estranho queixume!


Silêncio, tu vais-te molhar.


Halley Came to Jackson - Mary Chapin Carpenter cover



Late one night when the wind was still

Daddy brought the baby to the window sill

To see a bit of heaven shoot across the sky

The one and only time daddy saw it fly.


It came from the east just as bright as a torch

The neighbors had a party on their porch

Daddy rocked the baby, mother said amen

When Halley came to visit in 1910.


Now, back then Jackson was a real small town

And it's not every night a comet comes around

It was almost eighty years since its last time through

So I bet your mother would have said amen too.


As its tail stretched out like a stardust streak

The papers wrote about it every day for a week

You wondered where it's going and where it's been

When Halley came to Jackson in 1910.


Now daddy told the baby sleeping in his arms

To dream a little dream of a comet's charms

And he made a little wish as she slept so sound

In 1986 that wish came 'round.


It came from the east just as bright as a torch

She saw it in the sky from her daddy's porch

As heavenly sent as it was back then

When Halley came to Jackson in 1910.


And late one night when the wind was still.


      This song is about the writer Eudora Welty who saw Halley's Comet in Jackson Mississippi twice.  Mary Chapin Carpenter tells a nice story during her concerts about how Miss Welty invited her to her house and how she played the song for her. Mary is one of my most favourite magicians.


Carlos Marzal - A matéria do tempo

 


Talvez não exista o tempo – assim dizem alguns.

O presente contém, acaso, todo

o futuro que aguarda e o passado

onde nós fomos outros. Assim dizem.

O tempo, para mim, que sei que as palavras

são um jogo qualquer para passar o tempo,

é feito de caras desconhecidas

em cais, e de luas de espelhos

onde se deteve o meu fantasma,

de mentiras que não distingo já da verdade,

da dor antiga, que não hei-de aqui nomear,

os que amei e perdi, pelo barranco abaixo,

confusão e derrota, névoa e ruído.

O tempo é o que eu invento para escapar a tempo.


Não sei como há quem pense que o tempo não é real

(alguns inventam mesmo um absurdo demónio

a quem acabam por dar a alma).


O tempo não é um sonho, e a demonstrá-lo

aqui está o próprio tempo, que converte

estas palavras e quem as pronuncia

em carne de um olvido sem remédio.


   Do blogue Rua das Pretas, tradução de A.M.


Alfonso Simonetti - And she never returned

 

      Alfonso Simonetti was an Italian painter, best known for his works with moonlight and sunset effects. Here, a woman sits on a cliff edge under a cloudy sky, gazing at the bright full moon. The scene is illuminated by moonlight, highlighting the rugged landscape and a lone tree. The title helps the painting, she was so mesmerized that she never returned to her duties.  


Carlos Drummond de Andrade.- José

 


E agora, José?

A festa acabou,

a luz apagou,

o povo sumiu,

a noite esfriou,

e agora, José?

e agora, você?

você que é sem nome,

que zomba dos outros,

você que faz versos,

que ama, protesta?

e agora, José?


Está sem mulher,

está sem discurso,

está sem carinho,

já não pode beber,

já não pode fumar,

cuspir já não pode,

a noite esfriou,

o dia não veio,

o bonde não veio,

o riso não veio,

não veio a utopia

e tudo acabou

e tudo fugiu

e tudo mofou,

e agora, José?


E agora, José?

Sua doce palavra,

seu instante de febre,

sua gula e jejum,

sua biblioteca,

sua lavra de ouro,

seu terno de vidro,

sua incoerência,

seu ódio - e agora?


Com a chave na mão

quer abrir a porta,

não existe porta;

quer morrer no mar,

mas o mar secou;

quer ir para Minas,

Minas não há mais.

José, e agora?


Se você gritasse,

se você gemesse,

se você tocasse

a valsa vienense,

se você dormisse,

se você cansasse,

se você morresse...

Mas você não morre,

você é duro, José!


Sozinho no escuro

qual bicho-do-mato,

sem teogonia,

sem parede nua

para se encostar,

sem cavalo preto

que fuja a galope,

você marcha, José!

José, para onde?


      O poema foi publicado originalmente em 1942, na coletânea Poesias. Ilustra o sentimento de solidão e abandono do indivíduo na cidade grande, a sua falta de esperança e a sensação de que está perdido na vida, sem saber que caminho tomar.

José Saramago - Carta a Josefa, minha avó

 



      Tens noventa anos. És velha, dolorida. Dizes-me que foste a mais bela rapariga do teu tempo — e eu acredito. Não sabes ler. Tens as mãos grossas e deformadas, os pés encortiçados. Carregaste à cabeça toneladas de restolho e lenha, albufeiras de água. Viste nascer o sol todos os dias. De todo o pão que amassaste se faria um banquete universal. Criaste pessoas e gado, meteste os bácoros na tua própria cama quando o frio ameaçava gelá-los. Contaste-me histórias de aparições e lobisomens, velhas questões de família, um crime de morte. Trave da tua casa, lume da tua lareira — sete vezes engravidaste, sete vezes deste à luz.

      Não sabes nada do mundo. Não entendes de política, nem de economia, nem de literatura, nem de filosofia, nem de religião. Herdaste umas centenas de palavras práticas, um vocabulário elementar. Com isto viveste e vais vivendo. És sensível às catástrofes e também aos casos de rua, aos casamentos de princesas e ao roubo dos coelhos da vizinha. Tens grandes ódios por motivos de que já perdeste lembrança, grandes dedicações que assentam em coisa nenhuma. Vives. Para ti, a palavra Vietname é apenas um som bárbaro que não condiz com o teu círculo de légua e meia de raio. Da fome sabes alguma coisa: já viste uma bandeira negra içada na torre da igreja. (Contaste-mo tu, ou terei sonhado que o contavas?) Transportas contigo o teu pequeno casulo de interesses. E, no entanto, tens os olhos claros e és alegre. O teu riso é como um foguete de cores. Como tu, não vi rir ninguém.

      Estou diante de ti, e não entendo. Sou da tua carne e do teu sangue, mas não entendo. Vieste a este mundo e não curaste de saber o que é o mundo. Chegas ao fim da vida, e o mundo ainda é, para ti, o que era quando nasceste: uma interrogação, um mistério inacessível, uma coisa que não faz parte da tua herança: quinhentas palavras, um quintal a que em cinco minutos se dá a volta, uma casa de telha-vã e chão de barro. Aperto a tua mão calosa, passo a minha mão pela tua face enrugada e pelos teus cabelos brancos, partidos pelo peso dos carregos — e continuo a não entender. Foste bela, dizes, e bem vejo que és inteligente. Por que foi então que te roubaram o mundo? Quem to roubou? Mas disto talvez entenda eu, e dir-te-ia como, o porquê e o quando se soubesse escolher das minhas inumeráveis palavras as que tu pudesses compreender. Já não vale a pena. O mundo continuará sem ti — e sem mim. Não teremos dito um ao outro o que mais importava.

      Não teremos, realmente? Eu não te terei dado, porque as minhas palavras não são as tuas, o mundo que te era devido. Fico com esta culpa de que me não acusas - e isso ainda é pior. Mas porquê, avó, por que te sentas tu na soleira da tua porta, aberta para a noite estrelada e imensa, para o céu de que nada sabes e por onde nunca viajarás, para o silêncio dos campos e das árvores assombradas, e dizes, com a tranquila serenidade dos teus noventa anos e o fogo da tua adolescência nunca perdida: «O mundo é tão bonito, e eu tenho tanta pena de morrer!»

      É isto que eu não entendo — mas a culpa não é tua.

Nota: José Saramago escritor de crónicas. Esta foi publicada no jornal A Capital  em finais dos anos 60 e nelas retrata com muito amor a sua avó.


Alain Rouschmeyer



      "Painting is a long story of a silent dialogue between the work and me. My journey is a continuous exploration of the invisible territories that surround us. Each canvas becomes a space for meditation, where lines, colours, and perspectives tell stories suspended between reality and emotion. 

      I do not paint what I see, but what whispers between the images, those interstices where life unfolds in all its fragile intensity. For me, painting is not to reproduce but to interpret, transform, to make the invisible visible."


António Gedeão - Um Sorriso para Cibele

 


Aqui não há nada, Cibele,

a não ser uma alameda estreita

com renques de flores à esquerda e à direita.


As flores são daquelas de que eu não gosto, Cibele.

Pretensiosas.

Zínias, dálias, crisântemos, margaridas e rosas.


As flores de que eu gosto

são das que ninguém planta nem semeia,

Daquelas que a gente passa e diz:

«Olhe, faz-me favor. sabe-me dizer como se chama esta flor?»


Não gosto delas, não,

Mas à falta de melhor, Cibele,

É nelas que cevo a minha solidão.


Todas as manhãs,

quando aqui passo para as ver,

acaricio-as à flor da pele

e balbucio as palavras

que ficaram por dizer.


Assim se vai passando o tempo, Cibele.


Tordesilhas revisitado

 


Um dia, dividimos o universo entre os dois,

e eu dei-te a minha parte.


    in, xilre


José Antonio Fernández Sánchez - Quando quero tremer

 


Quando quero tremer leio e escrevo.

Construo pontes de palavras,

misturo versos como argamassa

e quando sinto frio

cubro-me, então tremo.


Frank Sinatra and Ava Gardner - My Way Of Life



Gotta have you near all the time,

with your dreams wrapped up in mine

Gotta be a part of your soul

and your heart all the time.


Nothing in the world that I do

means a thing without you

I'm just half alive in my struggle

to survive without you.


  You are my way of life, the only way I know,

  you are my way of life I'll never let you go.


Never let you out of my sight,

be it day, be it night

You belong to me, that's the way it will,

be wrong or right.


I don't need the crowds at my door,

the applause from the floor

All I need is you and the love we once knew,

nothing more.


  You are my way of life, the only way I know,

  make me your way of life I'll never let you go

  because I love you so.


  You are my way of life, the only way I know,

  make me your way of life, don't ever go.


      Sinatra met her in 1950 at a party. The singer was married to his childhood sweetheart and wife of 12 years, Nancy Barbato. The mother of three left Sinatra after his affair with Gardner became public. Weeks after the pair’s divorce became final in 1951, Sinatra married Gardner. Nancy went on to raise their three children: Nancy, Frank Jr. and Tina. For years, many believe that when it came to Frank Sinatra’s love life, Ava Gardner was the one who got away, but for ol’ blue eyes, the hot and heavy romance was bound to burn.


Ludwig Knaus - Girl in a Field

 


      Ludwig Knaus is a German painter. His work was highly valued during the second half of the 19th century, and it is still highly valued today. Knaus's works are filled with subtle observation, the ability to skillfully convey the character and state of mind of his heroes. So, what do we see in his painting "Girl in a Field"? There is no heroism. An ordinary moment of life. A simple scene - a little girl in a red bonnet collects herbs and flowers. She carefully puts them in the hem of her dress, carefully sorting through each leaf and stem. In her red cap, she looks like the flowers that grow among the grass.


Golgona - Olhe, preciso de dinheiro

 


Olhe, preciso de dinheiro.

Preciso de muito dinheiro. Quero abrir um negócio.

Algo meu, sabe como é. Estou farto de patrões.

Não posso passar a minha vida atrás de um balcão.

A levar todas as noites com a baba dos perdidos nas trombas.

Já não tenho paciência.

Com esta idade, já viu o que é.

Sujeitar-se a todos os labregos.

Já tentei noutros bancos, sim.

Pedi também aos meus pais, é verdade;

disse-lhes que era para me casar.

Não, não tenho casa, nem automóvel.

Mas, olhe, posso garantir com o meu corpo.

O meu fígado, senhor, tem que ver o meu fígado.

É fígado de motard. Isto parece encolhido e tal,

mas anda a mil.

E adiantado, não pode pagar nada como entrada?

Entrada, não sei.

Só se for o coração.


Ana Salomé - A partir de agora

 


A partir de agora, todo o poema que fale de amor, fora.

Todo o poema que não revolucione, fora.

Todo o poema que não ensine, fora.

Todo o poema que não salve vidas, fora.

Todo o poema que não se sobreviva, fora.

Vou deixar um anúncio no jornal:

Procura-se poeta. Trespasso-me.


 in, Criatura 4, da autora do blogue Pátio Alfacinha


António Ramos Rosa - A palavra é curva

 


A palavra é curva Nunca atinge

o alvo Só o silêncio

é recto

Mas a chama de um e de outro

limpa a lepra do tempo

e descobre a fonte branca

como a palavra oculta que na página respira.


Alberto Pimenta - A Lixeira cultural

 


Contribuo

com o que posso

para

a lixeira cultural


não é muito. eu sei

outros dão muito mais

eu não passo de um amador

enfim


o importante

é cada um dar o seu melhor

como dizem os irresponsáveis.

 

Cliff Richard - Evergreen Tree



Oh darling, will our love be like an evergreen tree

Stay evergreen and young as the seasons go

Your kisses could make love grow like an evergreen tree

Bloom in the summer's sun and the winter's snow.

On every branch will blossom, dreams for me and you

Our tree of love will stay evergreen, if our hearts stay ever true.

Oh darling, I love you so, don't you know that I'll be,

True 'til the leaves turn blue on the evergreen tree.


      In botany, an evergreen is a plant which has leaves that remain green throughout the year. Friendship and love should be like it. In those times then, we had nothing, but we were free!


Emile Claus


      Emile Claus foi um pintor flamengo deslumbrante. Representante do impressionismo belga, foi influenciado pelos impressionistas franceses como Claude Monet, que chegou a conhecer durante as suas viagens a Paris por volta de 1890. Nesta tela já se notam essas influências. 


Umar Abass - Se assim quiseres

 


Se assim quiseres,

cobre de trevas o céu

e açoita os cumes, enfurece os rios

mas amerceia-te desta casa

que três vezes ergui

da fúria e da maldade dos homens.

Nada sei mais frágil que estes muros

em que à noite um mísero fogo

me aquece e me ilumina,

faz-me por isso o favor,

passa ao largo

e a castigar castiga as muralhas do alcácer,

que se ergueram para desafiar o mundo,

e não a mim, que não desafio ninguém.


      O poema faz lembrar If it be your will de L. Cohen, inspirado no verso da oração do Pai Nosso "Seja feita a Vossa vontade, assim na terra como nos céus". Pungente!


Arquivo do blogue